O quanto, em sua fragilidade, você já permitiu que outra pessoa, conhecida ou não, influenciasse suas decisões, a ponto de começar a fazer o que não queria fazer inicialmente?
Foi uma das perguntas que me fiz, depois de assistir ao filme “HISTÓRIA DE UM CASAMENTO”, muito entusiasmada pelas críticas desse lançamento da Netflix.
E, agora, faço a pergunta a você: O quanto, em sua fragilidade, já permitiu que outra pessoa, conhecida ou não, influenciasse suas decisões, a ponto de começar a fazer o que não queria fazer inicialmente?
Vejo situações como essa ocorrerem em muitas das sessões de mediação, tanto em empresas quanto em famílias. De repente, a desconfiança aumenta entre as pessoas. De repente, alguém começa a exigir coisas que não desejava… Só para não ficar em desvantagem.
Foi por esse olhar que assisti e revi “História de um Casamento”, produção estrelada por Scarlett Johansson (Nicole) e Adam Driver (Charlie) e dirigida por Noah Baumbach. Haveria muitas possibilidades de leitura, pois ela é riquíssima em humanidades.
O filme, logo no início, nos coloca em contato com o reconhecimento amoroso de Nicole pelo marido, Charlie, e vice-versa, enquanto leem cartas escritas sobre o outro. Carinho, admiração e gratidão são mencionados, como confissões que revelam o amor mútuo. Mas, em seguida, compreendemos que as referidas cartas são exercício para uma sessão de mediação, antes do divórcio.
Como mediadora, também lanço mão de atividades similares para que as pessoas entrem em contato com percepções apreciativas sobre si mesmas e sobre o outro e se lembrem de quem foram, como se conheceram e construíram um caminho até o momento.
Nicole, no entanto, se recusa a ler suas páginas e, também, a ouvir as que Charlie escreveu. E sai da sessão deixando o mediador e o marido sem ação…
Várias poderiam ser as interpretações desse abandono do processo. Eu me lembro de um artigo que escrevi, há poucas semanas, sobre conversas difíceis, para compreender a personagem. Nicole passava por um momento de transição bastante importante, estava insatisfeita com vários aspectos da sua vida e da sua relação com o marido. Tinha uma nova proposta de trabalho, em outra cidade. E começou a se dar conta que queria viver a sua própria vida, pois até então vivera “a do marido”. Enfim, vários e instigantes MOTIVOS HUMANOS DE TRANSFORMAÇÃO.
Em especial, em algum momento, interpretou as falas do mediador e de Charlie como parceria e, ainda, pode ter se sentido sozinha naquele ambiente. Enfim, vários fatores podem ter contribuído para que ela saísse dali e optasse por abandonar a mediação. (É bom que se diga que tomamos muitos cuidados e fazemos contratos claros para que isto não ocorra. Mas, às vezes, pode ocorrer).
As cenas seguintes mostram claramente o caminho que dá origem ao título desta nossa conversa, GANHAR OU NÃO PERDER?
Embora o casal tivesse se entendido parcialmente em relação ao divórcio e conseguido uma boa autocomposição de soluções (compondo as negociações a partir de ambos), Nicole decide, por influências de pessoas totalmente fora da relação dos dois, procurar uma advogada cheia de armadilhas para que ela ganhe coisas que sequer havia pedido no acordo já feito com o futuro ex-marido.
A advogada (interpretada na medida por Laura Dern), no alto do seu conhecimento adversarial (claro!), entra com vários pedidos para garantir que Nicole saia vencedora. Detalhe: NICOLE NÃO QUER SAIR VENCEDORA, mas vai se deixando levar pelos processos, mesmo contra a sua própria vontade, por que a advogada habilmente instala o vírus do MEDO DE PERDER em seu coração.
Charlie, então, recebe a notícia de que precisará, agora, de um advogado, porém, resiste enormemente à proposição de se tornar adversário de sua esposa, até que é obrigado judicialmente a “contrair” um advogado e, assim, TAMBÉM É INOCULADO com o vírus do MEDO DE PERDER.
Eles não queriam ganhar nada, já estavam com seus acordos de parceria combinados. Teriam que entrar em algumas negociações mais adiante, claro, mas não se viam como inimigos. Tinham dores na relação, mas não tinham indignidades, não tinham manipulações, não tinham más intenções. Tinham amor e respeito ainda.
Até que A COMPETIÇÃO SE INSTALOU no processo…
Daí em diante, o que se vê é um processo de divórcio manobrado por advogados bastante competitivos e repleto de manipulações das muitas verdades observadas para o ganha-perde. Um processo durante o qual até mesmo o amado filho é utilizado como forma de punir e ferir “o inimigo”.
E, para isto, utilizaram o caminho de ATACAR UM AO OUTRO, até que passam a DESTRUIR o que tinham de melhor: AMOR e CONFIANÇA.
Fiquei pensando, então, sobre como é fundamental cuidar mais e melhor das nossas relações. Ou seja, que tal poder compreender mais as motivações do outro? Que tal procurar pessoas mais isentas e equilibradas para desabafar? Que tal passar a ouvir menos os “conselhos” de quem só ouve uma parte da história e já se coloca como “paladino da justiça” de uma dor alheia?
E, por outro lado, como ser aquele amigo ou aquela amiga capaz de ouvir as dores de alguém sem construir uma imagem de inimigo da outra parte? Seria incrível oferecer um ambiente de desabafo sem julgar ou condenar, uma vez que não estamos vivendo aquela situação de fato, concorda?
Assim, o meu convite é: busque sempre ter e manter relações mais saudáveis e sustentáveis.
Como inspiração, cito uma das mais lindas cenas do filme, quando Charlie canta “Being Alive”, enquanto conversa com amigos em um bar. Poeticamente, ele pede por: “Alguém que o faça perceber que sempre estará lá, tão assustado quanto você, para o ajudar a sobreviver, …a estar vivo…a estar vivo…a estar vivo…”
Viver é relacionar-se!