Inspire-se! Transforme-se!

Juro que não queria, mas eu já desejei o mal de alguém!

– Tempo de leitura: 4 minutos
descuido com bem-estar dos outros

Você já desejou o mal de alguém? Já quis ver uma pessoa que fez algo que descuidou do seu bem-estar, recebesse em dobro, triplo, tudo aquilo que você não gostou de sentir? Já imaginou que o mundo, ou ao menos o seu mundo, seria muito melhor se essa pessoa não existisse… vulgo, morresse?

Eu já. Estes e tantos outros desejos. Com intensidades variadas. Inúmeras formas criativas de imaginar como o outro poderia se ferrar gostoso. Ah, e não foi com uma pessoa só não, viu. Foi com várias. E, olha, com um sorriso de prazer ao imaginar.

E… tá tudo bem pensar estas coisas.

Calma lá! Sem interpretações. Eu disse que tá tudo bem pensar estas coisas. E isso não significa que eu (ou você) vá contribuir ativamente para que elas aconteçam.

Inclusive, dizer pra mim mesmo que não posso pensar não faz com que os pensamentos sumam. Na real, isso só me faz chicotear-me arduamente por ter pensamentos sórdidos e incompatíveis com “a boa pessoa que sou”.

Então… com muitas chicotadas… bem vinda culpa!

Quais culpas tu carrega aí por fazer algo que não condiz com a boa pessoa que se diz ser? Não precisam ser esses pensamentos que citei. Pode ser qualquer culpa.

Aqui, tem várias. E com cada uma destas culpas, tenho conversado com amor. Amor. Amor. Amor.

Amor. Difícil essa palavra. Amar o que considero meus defeitos e coisas feias, que precisam ser extintas?

Sim! Amar o que há em mim e quero ver distante de mim. Quanto mais distante quero essa parte odiável, mais preciso trazê-la pra perto.

Paradoxal. Tô ligado. Mas segue aí. Vai que a gente se surpreende com algo. Continuemos com uma pergunta:

Ei pensamento impuro e desumano, do que você está querendo cuidar? Quais dores te trazem até minha consciência?

O pensamento responde (pensamento = parte de mim que tô escutando internamente):

Rapaz, tô cansado. Tô com raiva. Não consigo compreender de jeito nenhum as atitudes de fulano. Inclusive, acho injusto que suas decisões me impactem de tal forma. E outra, com a recorrência dos comportamentos que percebo, já não tenho esperança de mudança dele. Acho suas atitudes um descuido imenso com a coletividade.

Claro! Tem dor pra caramba envolvida aí, Sérgio. Esses julgamentos e “imoralidades”, esse desejo de que o outro aprenda que não é legal descuidar do seu bem-estar e do bem-estar de outras pessoas, por meio da dor, é legítimo. Você tá achando que experimentar a dor pode ajudar a pessoa a se sensibilizar, né!

– É! Acho sim. Acho que ele sentir uma dor grande ou maior vai ajudar a perceber que poderia fazer algumas coisas diferente. E, na real, tem outra coisa também. Eu tenho uma vingancinha presente (vergonha infinita de mim mesmo ao assumir isso) e quero que ele pague. Não é um olho por olho no sentido literal, sabe. Sem perder o olho, mas pagar um pouquinho com dor né… que mal tem?

Caraca. Como é foda assumir que tenho esse desejo de ver o outro sofrer como forma de trazer tranquilidade e conforto. Para reparar aquilo que não tá legal pra mim. Me sinto péssimo, na real, ao reconhecer esse pensamento (chicoteando-me de novo).

Maaaas, vamos lá! Dá pra ir além do jogo da culpa.

Eu não sou meus pensamentos. EU. NÃO. SOU. MEUS. PENSAMENTOS.

Aprendi desde muito cedo que a melhor forma de reparar uma situação é o outro pagando por isso. Castigo em casa. Castigo na escola. Vai pra diretoria. Toma suspensão. Advertência no trabalho. Se faço algo que amizades não gostam, cobrança por ter agido assim. Falta de acolhimento. Em tudo que é lugar. Processo jurídico. Juiz batendo o martelo. Mocinho e bandido. Cinema. Novela. Bandido tem que se ferrar bonito. Mocinho sempre sai por cima e é exaltado. Cultura mainstream. Pressupostos de relação.

Sou bombardeado dia e noite, todo santo dia, desde que me conheço por gente, com essa ideia da dualidade. De que existe um certo e um errado muito bem definidos e cristalizados. De que o errado (que significa diferente do que acho certo) não tem espaço para existir e precisa ser extinguido. Ou, ao menos, marginalizado. Pecado. Punição.

Esses pensamentos são parte de minha experiência de vida. Minha trajetória. E, por mais que eu não goste nem um pouco de tê-los, é preciso honrá-los. Reconhecer que eles, até hoje, têm servido para um propósito. Justiça. Respeito. Cuidado. Dentre outros.

Reconhecidos e abraçados, com amor, com muito amor, posso agora dialogar com eles. Não preciso espantá-los não. Nem sair correndo. Posso sustentar, internamente, essa dor que surge ao reconhecer que não são legais. E trabalhar ativamente para construir novos recursos internos de lidar com as minhas violências. Com meus pensamentos violentos. E com os comportamentos de pessoas ao meu redor.

Agora, a parte complexa. Ou mais complexa que a anterior.

Quando eu acolho a minha dor e esses pensamentos que não gosto de sentir. O que rola? O que vem depois?

Escuta. Muita escuta. Se eu não quero que o outro pague em dobro, o que mais eu poderia querer? Se não vejo a reparação por vias dolorosas, o que mais seria reparação?

Eis a questão! Chegamos no ponto crucial. Rompi a roda que gira todo santo dia, desde sempre. A violência que se alimenta naquilo que penso. E não tenho repertório algum a partir de agora. Abre-se um caminho, legal. Mas desconhecido. Que medo de explorar.

Meus dedos coçam para concluir esse texto com alguma resposta, ou alguma experiência que tenho vivido. Mas quero terminar com uma provocação. Um exercício de imaginação.

Se, por um acaso (ou escolha), você começa a deixar de se culpar por agir/pensar de formas como não gostaria…

  1. O que muda da sua percepção sobre você?
  2. O que muda na sua relação com pessoas difíceis de lidar?
  3. Quais caminhos você começaria a construir e trilhar?
Sergio Luciano
Um mineiro que gosta de conversar, aprender com o cotidiano e escrever. Investiga psicologia junguiana, comunicação não violenta, poder, privilégio, democracia profunda, dentre outros temas, para tentar entender um pouco mais esse negócio de relacionar-se com o diferente.
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