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Oito armadilhas comuns de se cair em posições de liderança; e como evitá-las

– Tempo de leitura: 7 minutos

Ainda que pareça óbvio que a posição de liderança que assumimos é para ser usada a serviço da organização e não em benefício próprio, nem sempre isto acontece. Algumas vezes, inclusive, este uso inadequado do poder acontece de forma inconsciente. Guiado por nossas crenças, medos e vícios de comportamento.

Para exercermos uma liderança com responsabilidade e orientada a seu propósito, a autoconsciência tem um papel fundamental. E para apoiar nesse caminho de autoconsciência, falaremos aqui sobre algumas armadilhas sutis nas quais podemos cair quando estamos numa posição de liderança.

1. Usar o poder antes de merecê-lo

Toda posição de liderança que assumimos tem consigo a capacidade de influenciar pessoas dentro de uma organização, que podemos chamar de autoridade. Porém, essa autoridade passa a ser reconhecida e respeitada apenas quando temos a confiança das pessoas que se relacionam conosco. Assim, obtemos legitimidade.

Em alguns momentos, por conta da pressão, ansiedade ou necessidade de aceitação, pode ser que nos adiantemos em agir antes de ganhar a confiança daquelas com quem nos relacionamos. Nos valendo, talvez, da coerção como estratégia para obtermos cooperação. Quando isso acontece, existe um grande risco de um impacto indesejado nas pessoas e redução da autoridade que temos diante delas.

Dicas para cultivar legitimidade:

  • Crie relações com as pessoas ao invés de tratá-las apenas como engrenagens de um sistema;
  • Invista tempo e energia na criação de um espaço de expressão emocionalmente seguro para todas e todos;
  • Comunique suas ideias com clareza e contextualize-as, trazendo mais compreensão para suas motivações;
  • Peça feedbacks explicitamente sobre suas ideias, reforçando sempre a importância de todas as vozes serem ouvidas.

2. Fugir da autoridade

Buscando não fazer um mau uso do poder, deixamos de tomar uma posição ou fazer escolhas difíceis. Entramos num debate infinito de ideias, sem tomar uma decisão, evitando sermos opressores ou limitarmos a criatividade dos envolvidos. Fugimos de conversas difíceis. Deixamos de responsabilizar pessoas por suas ações e lhes tiramos possibilidades de aprendizado.

Como resultado, criamos apenas caos e confusão. As pessoas tendem a ficar perdidas e sem saber com clareza as expectativas em relação a elas, correndo também o risco de se tornarem desmotivadas e desengajadas.

Dicas para abraçar a autoridade e exercê-la de forma consciente:

  • Descubra e trabalhe seus medos, investindo em seu autodesenvolvimento;
  • Estude comunicação não violenta e aprenda a melhor escutar seus sentimentos e necessidades e também de outras pessoas;
  • Desconstrua a ideia de que precisamos “ser perfeitos” o tempo todo. Exercitar a vulnerabilidade, fale de sua dificuldade e crie um ambiente de mais humanidade.

3. Usar muita munição

Às vezes nos identificamos como a parte mais fraca de uma relação. Nesse momento surge o risco de já iniciarmos um encontro convencidos de que não conseguiremos transmitir nosso ponto de vista e nos preparamos para uma destas três reações: fugir da situação, entrar na defensiva ou atacar.

Toda colocação de outras pessoas soa como uma crítica ou desafio a nós. Criamos figuras de inimigo por onde passamos, como forma de justificar essa percepção que temos. Sem percebermos, desencadeamos conflitos por onde passamos.

Dicas para te trazer mais equilíbrio:

  • Identifique características que você percebe existir em outras pessoas e que contribuem para você se enxergar com menos poder na relação. Então, pergunte-se como você pode cultivar mais estas características em seu cotidiano;
  • Pratique respiração consciente. O simples exercício de fazer inspirações curtas e expirações lentas tem o enorme poder de oxigenar a mente e acalmar o coração.

4. Usar poder para resolver a baixa autoestima

O poder e privilégio que um papel de liderança nos dá, é como uma droga. É gostoso e faz bem ter pessoas nos ouvindo e vindo até nós. Saber que pessoas nos admiram, tê-las ansiosas para ter um tempo conosco e ver nossa voz tendo força, contribui para nos sentirmos importantes. Se temos alguma dúvida de nossas capacidades ou nos sentimos inadequados, logo isso se dissolve diante do afã dos admiradores. Nos fundimos e confundimos com o papel de liderança que exercemos.

Com o tempo, o papel que representamos e as impressões das pessoas ao redor passam a ser a melhor estratégia para aumentar ou manter nossa autoestima. Então, sem perceber, deixamos de nos preocupar com nosso desenvolvimento pessoal e emocional. O papel que representamos nos traz o conforto emocional necessário para viver.

Então, não nos imaginamos sem esse papel. Lutamos para mantê-lo. Muitas vezes, privilegiando nosso interesse próprio em detrimento dos outros e dos interesses da organização. E aí você pode imaginar os possíveis abusos de poder para se manter no papel que estamos.

Dicas para desenvolver-se emocionalmente e exercer a liderança com responsabilidade:

  • Busque autoconhecimento. Descubra e trabalhe os pontos em que você percebe que podem levá-lo a usar o papel que exerce na organização em benefício próprio apenas, esquecendo do seu compromisso com ela.
  • Preste atenção em outras áreas da vida, para além do trabalho. Espiritualidade, relações amorosas, família, diversão e amigos, momentos de relaxamento. Ocupe seu tempo com ações que cuidam destas outras áreas da vida. Quanto maior o grau de responsabilidade profissional, maior o risco de o resultado do trabalho passar a ser uma compensação do baixo bem-estar fora do trabalho.

5. Comprar a própria ideia

Em algum momento, pode ser que comecemos a criar um ambiente onde nossas ideias não podem ser desafiadas. Algumas vezes podemos fazer isso, conscientes ou não, como forma de nos protegermos e mantermos nosso poder e influência. Tudo que divergir do que acreditamos pode chegar como uma ameaça que desafia nossa autoridade. Sendo assim, alimentar nossas próprias crenças se pautando apenas naquilo que confirma o que já pensamos, parece ser uma boa saída para manter-se seguro.

Com o tempo, vamos deixando de conviver cada vez mais com ideias e opiniões desafiadoras e começamos a viver numa bolha só nossa e de pessoas que nos seguem, perdendo a conexão com a diversidade existente na realidade ao redor. Quanto mais reforçamos nossas próprias ideias, menos abertos nos tornamos a outras opiniões e possibilidades. Passamos a liderar para nós mesmos, esquecendo que estamos ali a serviço da organização. E, a depender do nível de influência que nosso papel tem na organização, isso impacta diretamente na forma como ela se relaciona com seu entorno.

Quando não temos espaço para o divergente, possivelmente comece a existir um ambiente fértil para o autoritarismo. Afinal, quando o diferente surge e não estamos a fim de escutar, a tendência é querer abafar essa voz. Com o tempo, pode ser que estejamos tecendo relações que se baseiam no medo e máscaras vão se criando mais e mais. E quando as pessoas não podem estar inteiras com tudo o que tem e são, então também se reduz sua disposição em contribuir com a organização. Desmotivação, baixo rendimento e rotatividade de colaboradores podem ser sintomas dessa liderança autocentrada.

Dicas para cultivar um ambiente propício a divergências, e para saber lidar com isso:

  • Desconstrua (em você primeiro, depois no grupo) a crença de que quando alguém diverge do líder ou de outros no grupo, esta pessoa é a perturbadora da estabilidade. Ainda que a manifestação surja a partir da voz de uma pessoa, ela provavelmente verbalize algo que está também presente em outras.
  • Fale abertamente da importância de escutar todas as vozes presentes e ressalte que esse é o caminho para espaços de confiança e liberdade para cada pessoa existir por inteiro. Quando podemos estar inteiros com o que somos, aumenta nossa disposição em contribuir.

6. Satisfazer nosso próprio interesse

Caímos nessa armadilha quando encarregamos um integrante de nossa equipe (subordinado) com um trabalho que, na verdade, é de nossa responsabilidade, mas achamos um saco fazer. Ao deixar de lado outras responsabilidades para “priorizar o que o chefe pediu”, suas entregas cotidianas podem atrasar e até deixarem de ser feitas. Mas, se o chefe pediu, está tudo bem atrasar ou não fazer. Afinal, o chefe é mais importante do que os processos da organização.

Também aparece nos momentos em que dizemos “é preciso respeitar as diretrizes da organização”, mas na primeira oportunidade, algumas vezes até descaradamente, tomamos uma atitude que depõe contra nossa fala. Esperamos dos outros algo que não estamos dispostos a cumprir.

Uma outra situação comum é quando promovemos pessoas próximas – como amigos, familiares, ou nossas prediletas – para posições chave da organização, sem qualquer critério claro e tentando esconder o fato de que a escolha foi exclusivamente pessoal.

Com o tempo, começa-se a surgir uma repulsa da equipe em relação ao nós e culmina na perda do respeito por parte da equipe. A performance pode cair. Alimenta-se, cada vez mais, a percepção de uma falta de justiça e coerência de nossa parte. Por não sentirem liberdade de falar algo, as pessoas vivem silenciosamente essa desconexão.

Começamos a culpar as pessoas pela falta de comprometimento e rendimento. Sem ver alternativas, começamos a “exigir” mais e mais das pessoas, nos tornamos impositivos, esbarrando ou atravessando a linha do abuso de poder para atingir os resultados esperados.

7. Nos acharmos a última bolacha do pacote

Assim como Narciso, ficamos hipnotizados pelo nosso próprio reflexo (nesse caso, o papel que assumimos). Dedicamos nosso tempo, conscientes ou não, à microgestão. Nos recusamos a delegar atividades, acreditando que somos melhores que qualquer um. Nos tornamos controladores, por não acreditar que as pessoas são capazes de tomar decisões e fazer escolhas acertadas.

Por termos conhecimento aprofundado numa determinada área, achamos que podemos dar pitacos sobre todo e qualquer assunto, até mesmo diante daquelas que estão para além de nosso conhecimento.

Quanto mais olho para mim mesmo, menos olho para o que está ao meu redor. Minha microgestão tira o poder e autonomia das pessoas, podendo até mesmo tornar o trabalho delas mais estressante pelo excesso de cobrança que faço. Querendo saber de tudo e controlar o que acontece, processos se tornam mais lentos e gargalos começam a surgir.

Obviamente, as pessoas são culpadas por tudo que acontece. Do alto da minha vasta sabedoria e experiência, sei exatamente quem culpar e como seguir sendo o mais fiel admirador de mim mesmo.

8. Deixarmos de nos responsabilizar

Quando as pessoas não nos sinalizam dos impactos de nossas ações em seu bem-estar, algumas vezes é mais difícil percebê-los. Com isso, também não nos responsabilizamos por estes impactos causados. E quanto mais importante o papel que exercemos, menor a probabilidade de as pessoas nos darem algum feedback, se não pedimos explicitamente. Ainda mais se forem críticas a algo que falamos ou fazemos.

Tem horas que gritamos e explodimos diante de uma situação de estresse. Em outras, buscamos maneiras de transferirmos a responsabilidade para terceiros e não lidarmos com um problema. Pode ser que, quando vemos oportunidade, tomamos o crédito de uma conquista, de responsabilidade de uma pessoa ou equipe, para nós.

Também nos vingamos de quem achamos nos fazer mal, ora expondo publicamente esta pessoa, ora espalhando rumores. E por termos um grande poder em mãos, começamos a acreditar que somos intocáveis.

Você se percebe caindo em alguma destas armadilhas? Ou que já caiu nelas em outros momentos? Segue algumas dicas para fortalecer seus músculos e exercitar com mais integridade seu papel de liderança:

  • Peça, explicitamente, feedback. Para as pessoas de sua equipe e seus pares de trabalho. Não só para aqueles que nomeadamente te admiram. Se possível, também para quem não gosta de você.
  • Quando possível, seja específico sobre o feedback que gostaria de receber. É pela gestão? É sobre alguma atitude que poderia ter causado desconforto no outro? É sobre a percepção que esta pessoa tem, de modo geral? Isso ajuda a compreender melhor os impactos de nossas ações.
  • Caso esteja em alguma destas armadilhas, pergunte-se: do que estas escolhas que faço estão querendo cuidar? Será que estou buscando valorização? Reconhecimento? Auto aceitação? Tranquilidade? Eficiência? Talvez a estratégia que estamos escolhendo funciona bem para nós, mas não é nada legal para a organização e para os outros. Sabendo dos impactos que estamos tendo e aquilo que valorizamos, podemos escolher conscientemente estratégias que melhor cuidam de nós, dos outros e da organização. Ao mesmo tempo.

Se você olhou para suas experiências e percebeu que já caiu em alguma destas armadilhas, celebre. Isso mesmo, celebre! Reconhecê-las é um ótimo primeiro passo para adotar novos hábitos e fazer novas escolhas. E espero que, a partir de agora, tenha recursos e motivação para começar a fazer algo diferente.

Sergio Luciano
Um mineiro que gosta de conversar, aprender com o cotidiano e escrever. Investiga psicologia junguiana, comunicação não violenta, poder, privilégio, democracia profunda, dentre outros temas, para tentar entender um pouco mais esse negócio de relacionar-se com o diferente.
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