Quando você pratica Comunicação Não Violenta no cotidiano, qual é o pensamento predominante em sua cabeça?
– “Como faço para me conectar com essa pessoa?”
– “Como faço para falar da forma correta segundo a CNV?”
Antes de tudo, não há uma escolha certa ou errada. A sua resposta pode te dar uma indicação de onde está na curva de aprendizagem do caminho que a CNV propõe.
O primeiro pensamento está mais presente na mente de quem ‘vivencia’ Girafa.
E o segundo aparece mais na mente de quem ‘faz’ Girafa.
A curva de aprendizagem da CNV
Quem já estudou ou leu um pouco sobre CNV pode ter ficado animado ao perceber que os conceitos básicos são fáceis de entender e ao ver alguém usá-los com fluência e naturalidade. Logo em seguida pode ter sido sobreposto por uma sensação de “não é para mim” ao ter uma interação onde usar CNV “não deu certo”.
Só que, gente, vamos com calma.
A CNV é tanto uma consciência – uma forma de pensar sobre e abordar nossa comunicação com outros – como um conjunto de habilidades. Além disso tudo, para nós que fomos socializados num cultura pautada na separação, também há muitas ideias e hábitos a serem desconstruídos.
Portanto, para integrar a CNV em nosso ser e agir a grande maioria das pessoas passa por uma curva de aprendizagem, da qual iremos ressaltar três fases-chave.
O primeiro passo é entender
Fundamentalmente, CNV é sobre intenção.
A intenção de conexão.
A intenção de conexão consigo mesmo.
A intenção de conexão com outros.
A intenção de conexão consigo mesmo e com outros, ao mesmo tempo.
A intenção de conexão com base na consciência das necessidades de cada um.
A intenção de conexão consigo mesmo e com outros, ao mesmo tempo, com base na consciência das necessidades de cada um.
E a partir dessa conexão podemos criar resultados mutuamente satisfatórios.
Se a gente conseguisse entender de cara este ensinamento em toda sua amplitude e profundidade e integrá-lo em nosso ser e fazer, é tudo que precisaria saber sobre CNV.
Depois do entender vem o fazer
Apesar de parecer uma ideia absurdamente simples – manter a intenção de conexão –, na prática mostra-se bem mais desafiadora. Portanto, a CNV construiu toda uma linguagem onde a construção gramatical e as palavras nos ajudam a:
– lembrar da nossa intenção de conexão;
– tornar mais fácil para os outros ouvirem nossa intenção.
Em outras palavras, quando pensamos ou dizemos “Quando eu vejo…, me sinto… porque preciso de… Você estaria disposto a…?” ou perguntamos “Quando te ouço dizer…, será que você se sente… porque precisa de…?” estamos FAZENDO GIRAFA, com o intuito de ancorar nossa intenção de conexão cada vez mais em nosso ser. É normal ter uma fase da curva de aprendizado onde falar essas frases básicas literais da CNV pode ser extremamente valioso.
Do fazer para o vivenciar
Quando esses quatro elementos estão incorporados e temos clareza que nossa intenção é de conexão, as palavras específicas que usamos se tornam menos importantes.
De fato, a intenção de conexão se expressa para além das palavras, seja em nossa linguagem corporal, no tom de voz, na energia que emanamos…
Por um lado, se nossa intenção não é de conexão, por mais que estejamos FAZENDO GIRAFA (falar da forma correta), isto provavelmente será percebido de outras maneiras e pode ser considerado até um uso manipulativo da CNV. Por outro lado, com a nossa intenção claramente em nossa mente, somos livres para adaptar as palavras que usamos para adequá-las à situação ou subcultura onde nos encontramos.
Nesse sentido, se começarmos a usar uma linguagem que soa ‘natural’ para nós sem termos ancorada bem a intenção de conexão dentro de nós, ela possivelmente dará voz àquilo que ainda está mais entrelaçada com ela: nossa forma de pensar ‘violenta’.
O VIVENCIAR GIRAFA, então, inclui a habilidade de falar numa linguagem natural – usar as palavras que tem sentido para e ressoam com seu parceiro de conversa – sem perder a intenção de conexão e a consciência das necessidades suas e do outro.
CNV não é sobre mudar a forma que você fala; é sobre mudar a forma que você pensa e enxerga o mundo. Para começar a VIVENCIAR A GIRAFA é um longo processo de prática. De cometer erros, se conectar e desconectar. Repetidamente.
Um exemplo para fechar
Para pessoas que descobriram a beleza da escuta empática recentemente, pode ser difícil dizer ‘não’ quando alguém chega querendo ser escutado. Seja por uma suposição de que quem ‘faz empatia’ está disponível e disposto a oferecer escuta 24/7. Seja por deixar se guiar pela necessidade de contribuir com o bem-estar do outro.
Ao aceitar oferecer uma escuta para além de nossa disponibilidade ou disposição estamos ‘fazendo girafa’ e nos esquecemos da parte de CNV que fala sobre expressão autêntica e honestidade. Tentamos nos conectar com a outra pessoa às custas da conexão com nós mesmos e, no final das contas, não estamos realmente presentes para o outro, o que pode sair caro para a relação mais para a frente. Se expressarmos esse ‘não’ indicando o desejo de oferecer escuta dentro de nossos limites, estaremos um passo mais perto do ‘vivenciar girafa’.
Vamos praticar?
Praticaremos o mesmo exercício da Dica 7. Afinal, o caminho de ‘vivenciar girafa’ é longo. E apenas na prática que ele se torna presente.
- Relembre uma situação recente que mexeu contigo. Pode ser algo que cuidou ou descuidou do seu bem-estar.
- Identifique nesta situação:
- Quais os fatos observáveis?
- Quais sentimentos presentes em você?
- Quais necessidades suas foram ou não foram atendidas?
- Existe algo que você gostaria de pedir para a outra pessoa?
- Exercite sua ‘girafa clássica’: escreva como você se expressaria, usando estes 4 elementos.
- Exercite sua ‘girafa natural’: escreva outras formas de se expressar de forma fluida, num diálogo cotidiano.